in Algarve Mais, Outubro 2011
Na Algarve Mais de setembro, o ilustre Dr. João Amado, no seu artigo de opinião, abordou a temática da redução de Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia. É parte do acordo assinado entre PSD, CDS, PS e a “troika”.
Como na generalidade das medidas do acordo com a troika, o objetivo é, simplesmente, cortar na despesa pública. Também concordo que é preciso cortar na despesa pública mas no desperdício e reorganizando o Estado para se gastar menos e melhor. Não como impôs a “troika”: cortar 9 mil milhões de euros a direito.
Assinou-se cortar 1 500 milhões de euros na Saúde, Educação e Segurança Social, até 2012. Corta-se 10% nas horas extraordinárias dos médicos, aumenta-se o número de alunos por turma para se reduzir o número de professores, reduz-se o tempo máximo de subsidio de desemprego para metade (1 ano e meio) e passados 6 meses é cortado 10%. Faltam as medidas de melhoria e otimização desses serviços e ignora-se que há despesa do Estado que é não é desperdício mas sim investimento, porque o salário de um médico ou de um professor é a garantia de bem-estar e de desenvolvimento.
Nas autarquias locais parece que, em primeiro lugar desaparecerão muitas mais Freguesias do que Municípios, considerando que os interesses PSD+PS instalados nas Câmaras têm poder e as Freguesias não. Em segundo lugar cortar-se-á 350 milhões de euros nas transferências para as autarquias locais, cerca de 15%.
Se apenas se preocuparem em cortar, vou mais longe: para se manter o quadro atual de pouquíssimas competências próprias e redução dos orçamentos das Juntas de Freguesia, deviam era extingui-las todas. Atualmente, já não fazem grande sentido se quase se limitam a passar licenças de cães e atestados de residência. Nas cidades têm ainda recursos financeiros mas as populações estão mais próximas da Câmara Municipal. Fora das cidades, onde as populações estão mais próximas das Juntas, estas não têm orçamento e competências para nada de importante.
É assim na minha Junta de Freguesia de Santa Bárbara de Nexe: 4 000 habitantes no interior de Faro e um orçamento anual que já foi reduzido de 76 000 para 66 000 euros e com mais um corte de 15% será reduzido para 56 000 euros. Com um orçamento destes, a atividade da Junta resumir-se-á a manter a secretaria aberta, passar licenças de cães e atestados de residência e ponto final.
Parece faltar na iniciativa do Governo o que é essencial: uma descentralização significativa de competências acompanhadas pelos respetivos recursos financeiros e um novo quadro de financiamento das autarquias.
Não deixa de ser significativo que os 2 países europeus mais centralistas – Portugal e Grécia – foram os que rebentaram. Em Portugal o grau de centralismo político-administrativo é de 90%, dependente de Lisboa, da capital, na França é 79%, na Holanda é 73%, na Dinamarca é 55%, na Finlândia é 65%, na Áustria é 50%.
Faz falta colocar as decisões locais/regionais junto das populações e os decisores em lugar de serem uns desconhecidos num qualquer gabinete lisboeta devem ser os que vão a votos e são avaliados junto das suas populações.
Mas também faz falta um novo quadro de financiamento das autarquias. Discordo com o Dr. João Amado quando refere que “ninguém negará que as autarquias gastaram acima das suas possibilidades, gerando endividamentos brutais para as gerações futuras”. Em 2010, o conjunto das Câmaras tiveram um resultado positivo de 70 milhões de euros e a generalidade do Estado teve um resultado negativo acima dos 7 mil milhões de euros. Existem certamente casos de má gestão autárquica mas não são generalizáveis, conforme o Dr. João Amado reconhece, acreditando “no poder local como principal força motriz do desenvolvimento social, económico e cultural das populações após o 25 de abril” e reconhecendo “o trabalho de muitos autarcas dedicados”.
As Câmaras não devem estar dependentes das taxas sobre a construção civil. Se uma Câmara em 2005 arrecadava 20 milhões de euros nessas taxas, em 2011 vai ter apenas 2 milhões. Em 2005 projetaram-se obras e pediram-se empréstimos quando se tinha uma receita que agora esfumou-se, fazendo disparar os níveis de endividamento. E ao mesmo tempo, ao longo dos últimos 30 anos, abriu-se a porta à corrupção e para aumentar a receita cresceram os desmandos urbanísticos.
Aliás, como proposta para discussão, a acompanhar a descentralização de competências, dos 35 mil milhões de todos os impostos cobrados em Portugal, em lugar de 90% estarem nas mãos do Governo, em Lisboa, deviam ficar: 2,5% nas Freguesias onde são gerados, 12,5% nos Municípios onde são gerados, 17,5% nas regiões onde são gerados; 27,5% num fundo nacional a repartir pelas Freguesias, Municípios e Regiões para corrigir fatores de interioridade e outros; e 40% para o Governo.
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