quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O mundo pode ruir

in Algarve Mais, Setembro 2011

1. Nos números de julho e agosto da Algarve Mais, citei o economista norte-americano Nouriel Roubini. Em 2005, avisou para o perigo de uma crise do imobiliário nos EUA, que viria a rebentar em 2007, despoletando uma crise mundial cujas consequências parecem não ter fim. Em junho deste ano, afirmou que corria-se o risco de, em 2013, explodir a maior crise que o mundo já teve. Já em agosto, disse que evitar uma nova recessão mundial pode ser uma missão impossível.

2. Em Portugal, na Europa, nos EUA, os Governos acabaram ou vão acabar com o investimento público, aumentam o desemprego, reduzem salários, comprimem o consumo e com o investimento privado congelado, o resultado é mais crise em cima da crise.

3. O Estado não pode gastar desalmadamente e é preciso cortar muita despesa no Estado, dos tachos, ao desperdício e à ineficiência, mas não através de cortes cegos, particularmente nos apoios sociais, saúde e educação, quando a maior parte da população mais deles vai precisar precisar.

4. Não existe uma justa distribuição dos sacrifícios, nem antes com Sócrates, nem agora com Passos/Portas. Quem paga a crise é a classe média com mais impostos e a classe baixa com o corte nos serviços públicos que utilizam sem outra opção. Afinal foi noticia recentemente que a fortuna dos 25 mais ricos de Portugal aumentou 17,8 por cento e que os lucros dos bancos e grandes empresas continuam bem altos.

5. Já o economista americano Richard Wolff refere que aponta que o crescimento da dívida norte-americana resulta do pagamento de cada vez menos impostos por parte das maiores empresas norte-americanas (as outras causas são os gastos nas guerras Iraque/Afeganistão e as ajudas aos bancos). Em Portugal, o impostos extraordinário correspondente a 50% do subsidio de Natal não é aplicado aos lucros astronómicos das grandes empresas, nem na sua distribuição aos milionários por via dos dividendos acionistas.

6. Não existe uma justa distribuição dos sacrifícios porque temos governos mundiais pouco competentes, inspirados ou rendidos a uma teoria neo-liberal, como em Portugal, especialmente através do Ministro das Finanças. Victor Gaspar está encantado com uma teoria que, sendo perfeita em teoria, na prática não funciona porque a sua suposta perfeição mecânica não tem em consideração que o ser humano não é um parafuso, tem emoções, gostos, desgostos, opções.

7. A teoria perfeita não funciona porque no equilíbrio mecânico entre a oferta e a procura, eu não tenho nenhum computador na cabeça que me diga na procura qual é exatamente o melhor automóvel que posso comprar com 20 mil euros ou que me diga que existe um automóvel de 25 mil euros que é a melhor escolha porque poupará mais de 5 mil euros em combustível ou reparações. No lado da oferta também não existe uma concorrência perfeita porque as grandes empresas têm acesso a informações e favores que distorcem o mercado.

8. E a teoria perfeita tem consequências perversas. As pessoas, o trabalho, passaram a serem considerados um custo e a esmagadora maioria dos ordenados estão estagnados ou em queda nas economias ocidentais. Os salários, em 1973, eram 56% do Produto Interno Bruto português, da riqueza nacional, em 1975 passou para 69% e em 2009 apenas 52%. Nos EUA, desde 1979 os rendimentos de 1% de famílias super-ricas aumentou quase 400% e os rendimentos de 80% das famílias ficou na mesma ou caiu.

9. Também se chegou ao ponto do dinheiro que circula no mundo, 90 por cento não tem nada a ver com produção e comércio de seja o que for. É especulação e apenas dinheiro que procura ganhar dinheiro sobre ele mesmo, movendo-se em segundos entre ações, moedas de países e preços futuros de produtos, provocando instabilidade económica e crises.

10. Se a distribuição da riqueza (especialmente através do trabalho) e o controlo sobre a circulação de capitais especulativos não for realmente uma prioridade, as economias e os países ocidentais tal qual os conhecemos vão ruir. Os sinais são cada vez mais evidentes, as crises, o desemprego, a redução do poder de compra, algumas explosões sociais.

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