terça-feira, 15 de março de 2011

Jovens sem futuro

Escrevi este artigo de opinião a meio de Fevereiro para a revista Algarve Mais, ainda antes de ter conhecimento que iriam acontecer as manifestações da geração à rasca do passado dia 12 de Março.
Na televisão passaram inúmeras imagens das revoluções na Tunísia e no Egipto, todas elas repletas de jovens, muita gente entre os 20 e 30 anos. Cerca de metade da população do Egipto e da Tunísia tem menos de 35 anos. Em Portugal apenas cerca de 35% tem menos de 35 anos. Temos uma população envelhecida e eles têm uma população jovem. E vimos esses jovens revoltados com a pobreza e o desemprego.

Desenganem-se se pensam que o desemprego jovem é só um problema dos outros. Portugal e a Europa têm um desemprego jovem em torno dos 20%, mas por exemplo em Espanha é 40%. E em Portugal como noutros países da Europa ainda temos uma elevada percentagem de jovens enleados em trabalho precário e baixos salários. Temos mais de metade da juventude sem trabalho ou em situações muito precárias.

É a geração retratada na música dos Deolinda: geração sem remuneração; já é uma sorte poder estagiar; geração ‘casinha dos pais’; sempre a adiar filhos e marido...

Podemos estar perante um problema de desemprego estrutural e é virtualmente impossível ter uma economia que consiga resolver esse problema. Mesmo a crescer muito, a economia é cada vez mais marcada pelas novas tecnologias e por menos necessidade de mão-de-obra. Por outro lado, o trabalho passou a ser considerado como um custo, um factor de produção como são as máquinas, a electricidade ou as matérias primas. Como mandam as leis económicas os custos são para reduzir e o trabalhador, não mais um ser humano distinto de tudo o resto neste mundo, vê o seu salário e as suas condições de trabalhos reduzidos.

Neste contexto, na Tunísia e no Egipto, pode ser meio caminho andado para a desilusão e a ascensão dos extremistas islâmicos porque não são as eleições por si só que vão resolver o problema estrutural do desemprego e da pobreza. O fracasso nestas matérias, abre caminho ao apelo ao sobrenatural e à assistência de raiz religiosa, tão ao jeito do Hamas na Faixa de Gaza.

Mas em Portugal e na Europa, entre os jovens, também cresce a insatisfação perante o desemprego, a precariedade e as baixas remunerações. Já temos assistido na França e na Inglaterra a rebeliões de jovens, ainda que com alguma inconsciência à mistura. No entanto vai-se adensando uma consciência da falta de perspectivas sobre o futuro e a explosão pode ser violenta perante a ausência soluções.

Perante o caos social eminente, vão-nos acenado, especialmente do campo da direita política, dos teóricos neoliberais a governantes como Angela Merkel, passando pelo aspirante Passos Coelho, com flexibilizações, choques fiscais e afins, sem mexer no ponto central da crise: o crescimento das desigualdades sociais.

Desde 1970 até aos dias de hoje a população mundial duplicou mas a riqueza mundial aumentou 20 vezes. Nunca o mundo foi tão rico mas desde a década de 1980 que, com o advento do neoliberalismo de Reagan e Tatcher, a distribuição da riqueza passou para segundo plano.

O insuspeito FMI - Fundo Monetário Internacional - publicou recentemente um estudo em que se conclui que a crise financeira foi provocada pelo aprofundamento do fosso entre pobres e ricos. Tal como acontecera na Grande Depressão de 1929, a crise financeira resulta da concentração crescente de riqueza nos mais ricos e o crescente acesso ao crédito dos mais pobres, sem recursos para viver nas sociedade modernas.

Nos EUA, entre 1983 e 2007, a riqueza nacional rendimento detido pelos 5% mais ricos aumentou de 22% para 34%, resultando disso mesmo, o endividamento da restante população. Tal como aconteceu entre 1920 e 1928. Portugal é o segundo país da zona euro onde há maior desigualdade na distribuição da riqueza e isso ajuda a explicar o nosso nível de endividamento.

Sem distribuição da riqueza, sem salários dignos, sem trabalho estável, que é para onde nos levam os nossos governantes e principais aspirantes, seremos jovens sem futuro e, conscientemente ou inconscientemente, a revolta explodirá.

1 comentário:

  1. eu já me fartei também de falar neste assunto, e penso que ainda terei que falar muito mais, porque Portugal está mesmo à Rasca.

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